Vestida de Voz

 photo laurawrona_zpsb0b1ddec.jpg
Era feriado e chovia muito em São Paulo. Eu havia comprado os ingressos para o show há um mês – pensando que se esgotariam em poucas horas –, fui uma das primeiras a preencher as cadeirinhas na tela do computador da atendente do SESC.

E chovia. A amiga que me acompanharia trocou o show por uma peça de teatro e eu estava prestes a fazer o mesmo, só que a troca seria menos digna, mas mais adequada ao cenário do dia – ela mesmo, minha cama.

Por sorte, venci a inércia por uma fenda do auto-sabotamento típico da argumentação preguiçosa, e, sem pensar muito, fui em direção ao Sesc Belenzinho para, enfim, assistir Laetitia Sadier apresentando músicas de seu album The Trip.

Sentei meio encostada, meio sem saber o que esperar, pois embora seja fã do Stereolab, não conseguia imaginar um show só de voz e guitarra, e do trabalho solo dela conhecia quase nada.

Laetitia entra no palco vestindo um vestido curto cor-de-rosa, sem afetação alguma ou qualquer adereço. Com sua guitarra começa então a apresentação e imediatamente saio de minha postura quase adormecida para postar-me com a máxima atenção ao que ela entoava.

Sua voz é de um timbre único, melancolia ensolarada que não demora muito para conduzir-me sem resistência alguma aos seus percursos.

Os acordes simples da guitarra pareciam imperceptíveis diante do principal instrumento, o vocal, capaz de preencher o teatro inteiro, incluindo meu peito àquela altura já totalmente aberto e entregue à beleza que se oferecia.

Em alguns momentos do show me lembrei das performances de Joni Mitchell e senti que naquele momento eu presenciava algo único, raro, de cantoras cuja voz é capaz de vestir a alma de quem escuta, fazendo do minimalismo a medida da transcendência.

Uma cantora, aliás, de quem sempre penso em falar é Lhasa de Sela, que – enquanto escrevia sobre a Laetitia – acabei me lembrando por também ter um timbre vocal que me emociona.

Lhasa nasceu no México, mas mudou-se para o Canadá na adolescência e lá fixou-se. Lançou três albums, La Llorona (1997) , The Living Road (2003) e Lhasa (2009). Durante a produção deste último, descobriu um câncer no seio que a levou a falecer no ano seguinte, aos 37 anos.

Conhecia sua música recentemente, não consigo me lembrar através de que meio e fiquei muito triste por saber da sua morte. Aproveito aqui para reverberar um pouco sua voz: http://lhasadesela.com/.

E para fechar esse texto cheio de vozes, recomendo o album “The Magic Place”, de Julianna Barwick, que escuto agora enquanto escrevo esse texto.

PS.: Através do Facebook, vi que o Dudu Tsuda, músico que admiro e colunista muito mais habilitado a falar de música que esta que vos escreve, fez um post sobre o show da Laetitia Sadier. Não quis ler para não copi… digo, me influenciar por suas opiniões, mas agora lerei e deixo aqui o endereço para quem quiser saber mais: http://br.noticias.yahoo.com/blogs/ultrapop/laetitia-sadier.html

por Laura Wrona.

Foto de capa por Tom Gilmore. Imagem interna por Laura Wrona.

Categorias

Laura Wrona Escrito por:

Cantora e compositora.

seja o primeiro a comentar

    Deixe um comentário

    O seu endereço de e-mail não será publicado.

    Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.