por Fernando Athayde.
Depois de assistir ao filme-concerto Roger Waters – The Wall (em exibição a partir de hoje pelos cinemas da rede UCI), a sensação que eu tive foi a de que Roger Waters deve ser uma pessoa ultra-perfeccionista e de difícil convivência. Mas a verdade é que o cara tocou baixo numa das maiores bandas que o mundo já viu e compôs canções que foram a música da vida de milhões de pessoas. Agora, aos 72 anos, ele pode fazer o que bem entender. E o que o músico escolheu para curtir a velhice foi reviver os tempos de glória do Pink Floyd com a apresentação clássica da ópera rock The Wall, de 1979.
O filme-concerto é, na essência da palavra, espetacular. Há fogos de artifício, cenários monumentais e aparatos tecnológicos dos mais sofisticados para recriar e ampliar a experiência da obra original. O velhinho Waters corre, pula, interpreta e não há quem diga que ele tem na bagagem todas as 72 primaveras que tem. Ou 70, na época da gravação do filme, imagino. A vitalidade dele impressiona tanto quanto a tecnologia usada para transformar o grande muro que vai de ponta a ponta do palco num telão, onde são projetadas cenas do filme The Wall, de 1981, e outras coisas relacionadas à performance.
A banda que acompanha o eterno baixista também está de parabéns. Não tem um ali que não seja um músico de ponta, desses caras que com certeza estão entre os melhores executores musicais do planeta e que devem gravar com Deus e o mundo. Ainda assim, Waters teve de destrinchar as partes originais tocadas pelo vocalista e guitarrista do Pink Floyd David Gilmour em dois membros do conjunto. Um toca. O outro canta. Afinal, algumas pessoas possuem talentos único e irreproduzíveis.
Entre algumas músicas da apresentação há ainda interlúdios encenados com Waters dirigindo um carro velho e pomposo pelas (belíssimas) estradas da França e Itália. Ele visita acompanhado dos filhos o túmulo do avô, morto na Primeira Guerra Mundial, e o do pai, morto na Segunda. Se eu escrevesse aqui que esses momentos são emocionantes, honestamente, estaria mentindo. Recuperar a humanidade de um rockstar, dissolvida nos anos de fama de influência, não é exatamente uma coisa fácil e que se faça através de uma encenação como essa. O legal mesmo é o show.
Bem, assistir o The Wall hoje pode ser realmente divertido, mas é difícil assimilá-lo como uma obra de arte cujos desdobramentos estéticos ainda são pertinentes. A atmosfera da performance pelo que ela é e representa é facilmente suprimida pela euforia de estar revisitando um clássico. O filme-concerto é certamente mais nostálgico que qualquer outra coisa. Ironicamente, o antibelicismo de Waters fica em segundo plano mediante a megalomania do show, que, para quem curte Pink Floyd, é um prato cheio, afinal, são quase três horas de som.
PS.: Após a sessão de imprensa do filme ainda houve a exibição de um material extra, com Roger Waters e o baterista do Pink Floyd Nick Mason respondendo perguntas dos fãs. O especial, que provavelmente não deve ser levado ao restante dos cinemas, é completamente dispensável, mas a primeira pergunta vale a pensa contar qual foi: “Numa briga entre Nick Mason montado num golfinho e Roger Waters vestido numa fantasia de urso, quem ganharia?”.
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