
O festival de música Desbunde Elétrico está fora dos padrões. Primeiro, porque parte dos músicos todas as etapas de produção e curadoria do evento. Em sua 7ª edição, a maioria das bandas já percebeu que não basta só fazer música e esperar por convites de festivais ou produtores, é preciso compor em todas as etapas do processo. Ninguém melhor do que o próprio artista para reconhecer em si mesmo as suas capacidades e limitações. O Desbunde Elétrico 2013 foi feito de capacidades e limitações.
Apesar da chuva e do mata a dentro para se chegar ao Bar Experimental (Antigo Curupira), em Dois Irmãos, o acesso e a saída do espaço transcorreram sem maiores dificuldades. Incluso o som do Festival que, em comparação a muitos eventos sem patrocínio ou estrutura profissional, funcionou bem em grande parte dos shows. Para registrar o evento, o coletivo Ostra Monstra esteve presente capturando imagens e depoimentos que deverão, em breve, estar disponíveis na internet. Produtores de festivais como Paulo André (Abril pro Rock) e Gutie (RecBeat), além de jornalistas e críticos musicais, como Jeder Jannoti Jr. (UFPE) e Carol Santos (Diario de Pernambuco) também compareceram ao evento.
Como pesar da noite, o lugar padrão que se tornou o atraso dos shows também marcou presença. Mas ali, entre amigos, conversas, tragos e drinques, não ficaria bem cobrar por atrasos. Não há relógios nas paredes do Experimental, ou melhor, não há paredes!
Os melhores momentos do festival foram marcados por apresentações de músicas que sequer foram gravadas, de artistas que ainda não lançaram discos; o fora do padrão se fará presente como característica primordial dessa nova velha geração de músicos pernambucanos: a ousadia.
Aninha Martins canta como quem está possuída artisticamente pelas vozes de Itamar Assunção & Isca de Polícia, seja pela composição provocativa e surpreendente, seja pela incorporação do cênico na apresentação. Carisma, talento, inteligência e maturidade para quem cantava solo somente pela segunda vez. A banda também é incomum em sua formação, com flauta, gaita e segundas vozes acrescidas de teclado, guitarra, baixo e bateria. Rodrigo Padrão é o músico que lidera os arranjos com a guitarra também presente nos trabalhos de Glauco & o Trem e Matheus Mota.
Aninha subiu ao palco depois dos shows de Jean Nicholas, menos folksinger, mais rocker, e JuveNil Silva com sua recriação bem humorada da Udigrudi e psicodelia recifense. Ambos com bons momentos, mas que, sem perceber, serviriam como abertura para o grande show e estreia da noite, o show “Esquartejada”, de Aninha Martins, que deveria estar, nesse momento, se preparando para entrar em estúdio com a banda para registrar o pulso e vibração daquele show, um EP com cinco músicas viria muito bem nos próximos meses.
Thats all right, mãe. by aninhamartins
O músico Zeca Viana subiu ao palco logo depois, trazendo consigo um novo álbum, Psicotransa, com ele, vieram a chuva mais forte, a homogeneidade sonora, guitarras acentuadamente pops e suas letras etéreas-metafóricas. Infelizmente, a plateia reagiu de modo disperso, parecia já reconhecer o som que viria de Zeca e sua banda. Não havia mais surpresas.
Em seguida, D Mingus e a Fantástica Kazoo Orquestra subiram ao palco, não para apresentar o novo disco de D Mingus, Fricção, lançado dias antes, mas para celebrar o momento especial que esse grupo de compositores, músicos e bandas têm passado.
06. Naturalmente punks by D MinGus
Já havia falado, lá trás, de Aninha, que ainda não gravou seu disco; agora, como segundo destaque, a generosidade de D Mingus em abrir o seu setlist para Angelo Souza, baixista da banda, vulgo Graxa, cantar as faixas “Bando de crocodilos” e “Molho”, que serão lançadas em breve. O set ainda teve espaço para “Casinha”, de Hugo Coutinho (teclado e voz), e para as participações de JuveNil Silva e Zeca Viana cantando em faixas dos discos anteriores de D Mingus, Canções do Quarto de Trás e Filmes e Quadrinhos. Generosidade compartilhada por Aninha, que no show anterior havia aberto o palco para as participações de German Ra e Matheus Mota.
Com isso, o Festival chegou a sua 7ª edição com uma aposta natural no inédito, ainda tão distante das costumeiras escalações de festivais mais conhecidos. Eu poderia questionar sobre o retorno de bilheteria, cachês para as bandas, cobertura da mídia local e milhões de outras coisas importantes, mas tudo isso, para mim, tornou-se desinteressante frente à surpresa de perceber as possibilidades de criação dessa turma, disposta a enfrentar as próprias limitações com música, deboche e parcerias.
por Carlos Gomes.
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