
“Pessoas que se enquadram cegamente no coletivo fazem de si mesmas objetos materiais, anulando-se como sujeitos dotados de motivação própria” – Theodor Adorno
Nunca entendi muito bem a fixação de Roger de Renor com o termo indie, sobretudo pelas variações da palavra, como indieota, que ele usava em tom debochado em alguns dos programas do Sopa Diário. Outra variação do termo, que aprendi com o colunista parceiro aqui do site Outros Críticos, Jeder Janotti Jr., é o indiegesto. Ambas as expressões subentendem uma ojeriza a tudo, ou a quase tudo, que advenha disso.
Lendo a crítica musical de sites e blogs ou reportagens sobre os principais festivais de música, nos últimos anos, bandas, das quais mais admiro, e que ultimamente continuo ouvindo, como Yo La Tengo, Sonic Youth, Wilco, Smog (atualmente Bill Callahan), entre outros, em algum momento da carreira foram associados ao indie. Numa escuta rasteira de alguns dos discos dessas bandas, naturalmente perceberemos que associá-los ao termo não contribuirá em muita coisa para refletirmos sobre a estética da banda ou o contexto musical do qual fazem parte. Ao que parece, falar em indie para designar um grupo de bandas, está em pé de igualdade com o odioso World Music ou MPB, o que, no fim das contas, são tão generalistas que perdem totalmente o seu sentido – se é que há realmente algum sentido claro nisso.
Dois termos generalistas, um associado do mercado musical estrangeiro, e outro como ruptura cultural de uma cena musical local: o indie e o mangue permaneceram conflituosamente em contato durante os anos 2000, aqui em Pernambuco, tendo o segundo termo adquirido o prefixo pós. Quando surgiram, o indie e o mangue eram encarados como contrapontos aos modelos estabelecidos há muito tempo pela indústria cultural, seja ela do ponto de vista das gravadoras, ou do modo ineficaz como o Estado tratava a música e cultura locais. Com o tempo, a meu ver, parte dos artistas enquadrados sob esse guarda-chuva começaram a perceber que o jogo do mercado (do qual a imprensa faz parte como ativo desse processo predatório) não sustentaria um mercado mais amplo, e, de alguma forma, sustentável, com diferentes atores interagindo e, sobretudo, com novas propostas de atuação cultural para o mercado como um todo.
O indie e o mangue foram usados à exaustão pelos mais diferentes personagens da cultura pernambucana, com suas intenções e reflexões específicas, e pela imprensa, seja ela jornais, sites ou revistas, para vender a pauta de cada dia. Assim sendo, sempre que uma expressão nova se apresenta como o novo, o diferente, o marginal, é bom ter o passado em conta, e entender que por trás das rotulações, coletividades e generalizações, há milhares de indivíduos com as mais diferentes opiniões e ações de fato, mesmo que obscurecidas pelo manto do coletivo.
por Júlio Rennó.
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