por Júlio Rennó.
Gostaria de retirar parte do significado comumente atribuído à expressão “brodagem”, como colaboração mútua, troca de serviços, trabalhos sem remuneração etc., para acrescer a essa expressão a palavra “crítica”, roubando do músico Hugo Coutinho (D mingus, Juvenil Silva, entre outros), que cunhou “crítica brodagem” num dos desdobramentos interpretativos de um texto intitulado “Mercadorias e Futuros”, semana passada, no Facebook. Em um trecho de sua fala, ele diz: “Uma coisa que acho péssimo é a crítica brodagem, e isso acontece bastante na imprensa escrita aqui do estado, não sei se pela proximidade dos artistas com jornalistas ou pela falta de imaginação desses últimos (essa não creio tanto) […]”
O senso comum atribui “crítica” como sinônimo de falar mal. Ele criticou o disco de fulano é igual a Ele falou mal do disco de fulano. Criticar como reflexão sobre o objeto de análise, levando em conta os aspectos intrínsecos (letra, melodia, arranjo etc) ou extrínsecos (contexto cultural, cena musical, gênero musical, mercado etc) da obra, no caso específico da música, ainda confunde grande parte dos leitores. Elencar, na análise crítica, aspectos que muitos consideram como negativos, deveria ser rotineiro para quem se debruça sobre trabalhos dos mais diferentes estilos, assim como também os críticos os são. O crítico musical não é uma tábula rasa, imparcial, abençoado para a escrita. É um sujeito com gostos, preconceitos, defeitos e, fã ou não de um determinado artista, tem que estar munido de argumentos fortalecidos pela escuta anterior, pesquisa e conhecimento de mundo amplo na área cultural, para que, a par dessas ferramentas, possa escrever o melhor texto possível. Nem sempre isso acontece.
Deve ser bastante complexa a filtragem dos milhares de discos que são lançados diariamente e enviados às redações dos jornais e a sites e blogs de música. Como decidir sobre qual disco escrever, se a diversidade é tão grande e o tempo sempre curtíssimo? A crítica brodagem é acentuada pela escolha somente dos discos que gostamos? Qual o poder que tem uma capa do segundo caderno tecendo somente elogios sobre uma banda? A mesma capa com observações que, aos olhos da maioria sejam negativas, terá que repercussão para o público e banda? A crítica tem o poder de afastar ou atrair ouvintes? Qual é o seu papel?
Uma coisa é certa, o tempo é restrito para todos, repórteres dos principais jornais, com milhares de demandas para cumprir, ou para autores de blogs e sites, que também tem um tempo reduzido para se dedicar aos textos, já que não será de sites e blogs que sairá o seu ganha-pão. No entanto, reconhecer o trabalho alheio, diante de tantos outros, como merecedor de uma escrita, não é uma decisão tão fácil quanto parece. Nem a crítica é tão importante, a ponto de ditar os rumos de qualquer banda. Ela é importante como reflexão cultural, e, de uma maneira ou de outra, encontrará espaço para a sua difusão, mesmo como exceção. Que a regra da brodagem resista somente nas relações de trocas, e a crítica como o lugar da escrita reflexiva, não como bênção. Se fosse artista, torceria sempre para que os textos surtissem o efeito de um soco no estômago, e não como massagem no ego.
POis é. Essa “crítica broder” é inclusive muito prejudicial à própria cena a qual ela massageia. sem uma real reflexão e discussão, tudo vai ficando caduco, e no final convergem todos os artistas “broders” e críticos e apreciadores pro mesmo buraco do “e agora, pra onde vamos??”. costumava discutir muito isso sobretudo dentro dessa nova cena de cinema do recife. muito “medo” de alguns críticos de realmente darem o tão desejado soco no estômago!! :)